A gravidez na adolescência é um desafio persistente no Brasil. Em 2020, um levantamento do Ministério da Saúde revelou que aproximadamente 380 mil partos foram de mães com até 19 anos. No Piauí, a situação é igualmente preocupante. Um estudo de Avaliação de Risco Social realizado recentemente em 559 escolas da rede estadual de ensino identificou que 912 adolescentes, com idades entre 14 e 19 anos, são mães ou pais.
O estudo, que tem como objetivo identificar estudantes que estejam em situações de risco e traçar estratégias para apoiá-los, foi feito pelo Governo do Piauí, através da Secretaria de Estado da Educação (Seduc-PI) em parceria com a Secretaria de Segurança Pública (SSP-PI). A avaliação foi aplicada em 210 municípios piauienses e quase 83 mil crianças e adolescentes foram mapeadas.
Os dados obtidos revelaram uma realidade muitas vezes não vista pela própria sociedade, e o número alarmante de adolescentes com filhos foi um dos pontos mais críticos do estudo. Isso porque, a gravidez precoce deve ser encarada como um problema que necessita de políticas públicas eficazes e integradas. Quem explica melhor é a delegada da Polícia Civil, Eugênia Vila.
“O número de adolescentes exercendo a paternidade ou a maternidade é alto. Mas é preciso lembrar que isso existe e estamos relevando esses números. Esses adolescentes estão indo para escola com dificuldade. É preciso ter um olhar atento e dar oportunidade para que eles consigam estudar e concluam seus estudos, pois isso impacta diretamente no processo de desenvolvimento humano”, afirma.
Segundo a delegada, o propósito do estudo é, justamente, revelar a existência dessas questões para que assim sejam criadas políticas assistenciais ou para que essas crianças e adolescentes sejam incluídas em políticas públicas já existentes.
“O que fizemos foi revelar que esses casos existem e, a partir daí, nascerão inúmeras políticas assistenciais e intersetoriais para lidar com esses desafios, que são inúmeros”, diisse Eugênia Vila, Delegada da Polícia Civil.
A gravidez na adolescência traz consigo inúmeras questões: além de as jovens estarem mais sujeitas a complicações na gestação, o processo ainda repercute negativamente na formação educação dos jovens que, muitas vezes, acabam interrompendo os estudos. Isso irá refletir diretamente em sua condição social e econômica.
Mais de 400 estudantes interromperam gravidez fruto de estupro
A Avaliação de Risco aplicada nas escolas do Piauí buscou mapear diversas situações de vulnerabilidade nas quais crianças e adolescentes podem estar expostos, abrangendo desde a ausência de infraestrutura e saneamento básico até a violência intrafamiliar e abuso sexual. Um dos dados que mais chamou a atenção, destacado pela delegada Eugênia Vila em entrevista ao O Dia, foi o mapeamento de 444 meninas que interromperam a gravidez resultante de estupro.
O número, no entanto, tende a ser ainda maior, tendo em vista que a subnotificação de casos de violência sexual é de 81%, conforme apontado pelo estudo.
“O censo nos traz macrodados e a partir dessas informações é que serão elaboradas soluções mais eficazes. Vale ressaltar que as escolas têm um papel importante nesse processo. Se a escola tem informações sobre casos de abuso, elas precisam registrar e trazer isso à polícia”, complementa a delegada.
Escolas tem mais de 200 estudantes em situação de alto risco
A Avaliação de Risco, feita em parceria com o Departamento de Matemática da UFPI, atingiu 50,4% do alunado piauiense, com foco em estudantes de 14 a 16 anos e de 17 a 19 anos.
A iniciativa partiu de uma demanda da Secretaria de Segurança para compreender as causas da violência escolar. Isso porque, em 2023, o Brasil vivenciou um aumento significativo de violência nas escolas, e o Piauí não foi exceção. As escolas estavam preocupadas, mas faltavam evidências e dados concretos sobre a violência escolar.
“A secretaria nos deu um desafio: saber o nível de risco individual dos estudantes para que possamos identificar aqueles em maior risco e desenvolver propostas de políticas sociais para eles,” explicou a delegada Eugênia Vila.
Conforme os dados do estudo, 211 crianças e adolescentes se encontram em situação de alto risco e que precisam de suporte imediato.
“Identificamos um grupo de pessoas que estão em situação de risco e isso precisa ser tratado imediatamente. E o que foi visto? Situações de violência sexual, intrafamiliar, evasão e abandono escolar. Vamos buscar tratar esses riscos que não podem ser adiados. A maior parte dessas crianças são meninas, em situações de risco que se atravessam”, destaca a delegada.
O projeto começou com um teste piloto em seis escolas de Teresina e contemplou 511 estudantes. Após a aprovação, a aplicação foi estendida para todo o estado. Foram formados mais de 3 mil avaliadores de risco para aplicação do formulário. O estudo é considerado um censo de risco social dos estudantes e permite identificar individualmente os riscos enfrentados por cada um. Dessa forma, ações mais direcionadas e eficazes podem ser desenvolvidas.